O Tempo passa sem parar, como um rio que corre em direcção ao mar, dissipa-se nas brumas da Memória colectiva... É o Tempo que serve a memória ou é a memória que serve o Tempo?
sexta-feira, 28 de março de 2014
Kraftwerk - Os Pais do Techno-Pop
Os “Kraftwerk” que em português significa
“Central Eléctrica”,foram e, ainda são,
um dos grupos mais influentes do rock na sua vertente mais electrónica.. Nascidos
no boom do então chamado “Rock Progressivo”, a sua sonoridade combina ritmos
repetitivos, melodias simplesconduzidospor um estilo clássico
ocidental harmonioso, minimalista e instrumentação electrónica. Durante a
década de 70 e início da década de 80 do século passado, as suas sonoridades
foram revolucionárias, influenciando diversos estilos de música moderna.
O grupo foi formado em Dusseldorf, em 1970,
por Florian Shneider e Ralf Hutter, ambos estudantes na escola Robert
Schumann,ondese conheceram nos finais da década de 60 enquanto
participavam num movimento experimental que incluía arte e música e que ficou
conhecida como “Krautrock” (Rock Alemão).O duo, inicialmente, tocava com um quinteto conhecido como
“Organisation” e que lançou o álbum “Tone Float” em 1970, mas rapidamente se
separaram,á excepção de Schneider e
Hutter que permaneceram juntos e lançaram os fundamentos de “Kraftwerk”.
As formações iniciais de Kraftwerk variaram
entre 1970 e 1974, já que Hutter e Schneider trabalharam com mais de uma dúzia
de músicos diferentes durante a gravação dos três primeiros álbuns e
esporádicas aparições para concertos ao vivo; presenças constantes foram as do
guitarrista Michel Rother e do baterista Klaus Dinger , que saíram para formar
o grupo “Neu!”. O único membro constante em todas as formações foi Florian
Schneider, já que Ralf Hutter saiu do grupo durante seis meses, em 1971, para
terminar o seu curso de arquitectura.
Os três primeiros álbuns foram
experimentais, livres da disciplina musical que haveria de preencher os seus trabalhos
futuros. “Kraftwerk”, foi editado em 1970,e “Kraftwerk 2”, editado em 1972, eram mais á base de improvisações
musicais (ao estilo “Jam sessions”) feitas com instrumentos musicais
tradicionais como a guitarra,baixo,
bateria, órgão eléctrico, aos quais juntavam por vezes violino e flauta. Ambos
os álbuns eram completamente instrumentais. Nos concertos de 1972 e 1973,
apresentavam-se como dueto, usando uma caixa de ritmos simples que substituía a
bateria, com ritmos pré-gravados retirados dum órgão eléctrico.No final de 1973, Wolfgang Flur juntou-se ao
grupo nos ensaios e, como trio, gravaram um especial para o canal televisivo
alemão ZDF.
Já com o álbum “Ralf und Florian”, editado
em 1973, os Kraftwerk aproximaram-se da sonoridade que os caracterizaria
futuramente, apoiando-se mais nos sintetizadores e na caixa de ritmos. Apesar
de ser todo instrumental na sua totalidade, este álbum marca a primeira
utilização do vocoder (deformador de voz), que viria a ser uma das assinaturas
do grupo. O som futurista e robótico do grupo foi influenciado pela revolta
energética que alguns artistas de Detroit, como “MC5” ou os” Stooges”,levaram a cabo nos finais da década de 60.
Em 1974 “Autobahn” veio internacionalizar.
Ainda não sendo totalmente electrónico, já que flautas, violinos e guitarras
ainda são utilizados ao lado dossintetizadores, mas começa a aperceber-se uma certa disciplina no som do
grupo, orientado numa só direção,afastando-o do dos álbuns anteriores. O tema-título tem a duração de 22
minutos, é intencionalmente longa pois pretende transmitir a sensação de se
viajar numa autoestrada: desde que se liga o automóvel, a concentração na
condução para não se ser distraído pela paisagem, ligar o rádio, e a monotonia
duma longa viagem. Descreve a A555,foi
a primeira autoestrada construída, entre 1929 e 1932, de Koln até Bona, sem
qualquer cruzamento.
“Autobahn”, cuja capa original mostrava a
autoestrada vista do habitáculo dum carro onde se pode ver no tablier o desenho
dos membros do grupo, foi pintada pelo artista gráfico Emil Schult que veio a
tornar-se um colaborador do grupo em álbuns futuros, foi um enorme sucesso
comercial em todo o mundo. O tema que dá nome ao álbum foi editado em single,
numa versão reduzida de pouco mais de três minutos paraapresentação ao público. O álbum, editado em
novembro de 74, serviu de suporte a uma tournée mundial que levou o grupo,
agora transformado num quarteto com a entrada dos percussionistas Wolfgang Flur
e Karl Bartos, pela primeira vez aos
Estados Unidos e Canadá onde obtiveram um enorme sucesso.
Depois da tournée de 1975, o grupo,
revigorado pelo sucesso obtido,começou
a trabalhar no álbum seguinte e ficou decidido que teria um tema central. Emil
Schult escreveu as letras e o grupo escreveu a música. Em outubro de 1975
“Radio-Activity” viu a luz do dia. Diferente dos álbuns anteriores onde apenas
existiam letras em inglês, o novo álbum apresenta-se como um álbum bilíngue com
letras em inglês e alemão e é também considerado um “Concept Albun” graças a algum
humor mordaz do próprio grupo (contrastando com a rígida imagem robótica que
apresentam), sugerindo no próprio título, que o álbum pode-se dividir em duas
partes distintas: uma sobre a radioactividade (implícita no próprio
tema-título); a outra sobre a atividade na rádio (suportada, á primeira vista,
pelo tema “Radio Stars”, mas que depois se percebe que é sobre outro assunto).
Uma vez mais se percebeu que a aposta do grupo era avançar para temas mais pop
com ritmos electrónicos á mistura e deixar para trás as experimentações
“avant-garde”.
Durante quase todo o ano de 1976 o grupo
esteve em tournée para promover o novo álbum, cujas vendas, na Grâ-bretanha e
no mercado americano, não obtiveram o sucesso que alcançou noutros mercados
europeus, o que lhes permitiu ganhar um Disco de Ouro em França. David Bowie,
cantor pop, entusiasmado com o som do grupo alemão, convidou-os para fazer as
primeiras partes dos seus concertos de promoção ao álbum “Station to Station”,
mas, devido a outros compromissos, o grupo teve que recusar. Inovando cada vez
mais nas suas actuações ao vivo,os
“Kraftwerk”, após terminarem a tour de apresentação de “Radio-Activity”,
fizeram um intervalo nos concertos até final do ano. Logo no início de 1977, o grupo entrou em
estúdio para iniciar a gravação de um novo álbum. Traziam no bolso uma série de
temas sugeridos por amigos e familiares, temas que, continuando a via iniciada
em “Autobahn”, falassem do “Trans Europe Express”, a série de comboios rápidos
que percorriam a europa desde os anos 50; outras sugestões iam da direção de
música que reflectisse o seu próprio
estilo musical.
Em
março de 1977, “Trans-Europe Express” surgia no mercado.Foi com grande satisfação que se percebeu que
o grupo continuava a afastar-se cada vez mais do estilo de improviso que
caracterizara o seu começo e cada vez associa um formato melódico e
electrónico, bem patente nos dois temas extraídos do álbum e editados em
single, “Trans-Europe Express” e “Showroom Dummies”, o primeiro fazia uma
generosa referência aos cantores pop Iggy Pop (de quem os elementos do grupo
eram fans) e David Bowie, porque este os convidara a actuar nos seus concertos;
o segundo, como que a agradecer o Disco de Ouro que o grupo ganhou, foi gravada
uma versão em francês intitulada “Les Mannequins”. Original foi também a
apresentação do álbum: a editora EMI alugou um comboio com carruagens antigas
da década de 30, no qual, durante a viagem, entre Paris e Reims, ao som dos
temas do álbum, o grupo fez a sua apresentação aos críticos. Entre o espanto
ea admiração dos críticos, e a recepção
positiva nos diversos mercados internacionais,
“Trans-Europe Express” deu continuidade á
conceptualidade iniciada com “Radio-Activity”, dividindo-o em temas: um, uma
meditação sobre as disparidades entre realidade e imagem, patente em “Showroom
Dummies” e “Hall of Mirrors”; o outro, a glorificação da europa, que surgem nos
temas “Europe Endless” e “Trans-Europe Express”
O álbum viria a influenciar a música,
principalmente no período pós-punkquando surgiram grupos como “Joy Division”, “New Order”, “Human League”,
“Orchestral Manouvers in the Dark”, ou “Depeche Mode”, entre muitos outros, que
viriam a marcar a música. Muita da sua sonoridade foi inspirada nos ritmos
electrónicos do álbum. Seguiu-se nova tournée com um êxito sem precedentes,
apenas comparável ao sucesso que o grupo voltaria a obter com a tournée mundial
que faria no início do século XXI.
O álbum seguinte do grupo seria o ponto
mais alto do grupo em termos discográficos e, por muitos, considerado a sua
obra-prima e um dos melhores álbuns da história da música. “The Man-Machine”.
Editado em maio de 1978, trazia consigo aquela que ainda hoje é considerada a
melhor música de pop-rock electrónico de sempre: ”The Model”, é um tema que, na
altura, foi considerado como estando muito á frente do seu tempo, com um ritmo
contagiante, totalmente electrónico, com uma letra simples, o tema foi um
enorme sucesso e cimentou ainda mais a já grande importância que o grupo já
adquirira a nível mundial.
Tal como os álbuns anteriores,
“Man-Machine” mantém a mesma divisão conceptual, com temas como
“Spacelab”,“Robots” ou “Man-Machine”
dedicados á ficção científica e as ligações entre humanos e a tecnologia;
outros como “Neon Lights” ou “Metropolis” , ou mesmo “The Model” falam do deslumbre da urbanização, alienação e da
futilidade da fama e, também, como o seu antecessor, viria a ter um enorme
impacto no movimento musical neo-romântico que surgiu na Inglaterra no início
da década de 80. Era tempo de nova pausa para o grupo.
A pausa iria durar três anos até um novo
álbum de Kraftwerkver a luz do dia.
Aconteceria em maio de 1981, “Computer World” foi editado e, felizmente para os
fans, o grupo manteve-se fiel ao seu som. A temática, desta vez, era sobre a
ascensão dos computadores dentro da sociedade.Usando novamente algum humor mordazem “Pocket Calculator”, o grupo conseguia um equlibrio quase perfeito
entre a utilização desta nova tecnologia (acessível a todos) e o admirável
mundo que se abria aos olhos (e ouvidos!) “By pressing down a special key, it plays a little melody…”. Já com o tema que dá título ao álbum, o grupo acentua os perigos
dessa tecnologia, ao detalhar algumas organizações presumivelmente todas elas
ligadas em rede. Ao fazer uma aproximação ás novas tecnologias, através do uso
da interactivade sequencial de todo o seu equipamento, o grupo permitia-se
espaço para alguma improvisação e assim fizeram-se á estrada novamente com a
“Computer World Tour 1981”, a mais ambiciosa tournée que o grupo alguma vez
havia feito, que incluía projecção de slides e filmes, em écrans apostos por
detrás das quatro figuras robóticas que eram os músicos, perfeitamente
sincronizados com a música e vocalizações minimalistas, executadas com
perfeição milimétrica, além da utilização de mini-computadores com os quais
executavam os seus temas e a utilização de robots, réplicas perfeitas dos
quatro músicos, que tocavam em palco o tema “Robots”. Esta é uma imagem difícil
de esquecer a que portugal teve oportunidade de assistir, quando da passagem do
grupo Lisboa, em 2004, num Coliseu dos Recreios completamente cheio de público
que variava entre os 12 e os 70 anos, naquele que terá sido um dos concertos
mais inesquecíveis de sempre.
Em 1982, o grupo, começou a trabalhar num
novo álbum inicialmente intitulado “Technicolor”, mas problemas relacionados
com direitos de marca registada, foi renomeado para “Techno Pop”.Após várias sessões de gravação, as ideias
pareciam ter-se esgotado e apenas conseguiram produzir o tema “Tour de France”
que seria editado em 1983. Este tema surgiu numa altura em que Ralf Hutter
desafiara os seus companheiros de grupo a se dedicarem ao ciclismo como forma
de recuperarem do desgaste físico que a tournée de 1981 lhes provocara.
Durante as gravações em estúdio, Ralf
Hutter teve um acidente sério de bicicleta durante um passeio com a namorada.
Esteve vários dias em coma profundo e pensou-se que nunca mais recuperaria e as
gravaçõestiveram que ser interrompidas
por tempo indeterminado. Ao mesmo tempo as fricções entre os restantes membros
da bandacomeçaram a vir ao de cima e
culminaram com a saída de Wolfgang Flurem 1987.
Entre avanços e recuos,Flur, cujo papel de percussionistase começara a apagar quando o grupo começou a
utilizar sequenciadores, queria sair mas aceitou ainda participar no novo álbum logo que Hutter
foi dado como curado, o grupo regravou e misturou os temas que tinham e
finalmente fizeram um novo álbum que viu a luz do dia em dezembro de 1986.
“Electric Café” assim se intitulou o trabalho. Considerado um trabalho infame pelo
tempo que demorou a produzir, percebe-se a falta de inspiração que o grupo
sofreu e, excluindos os temas “Technopop” e “Musique Non-Stop” que mostram
alguma garra e ritmos adequados, o resto do álbum é um completo vazio de ideias
e sem qualquer orientação musical. Ao ouvi-lo, Fica-se com a ideia de que o
grupo se deixou apanhar pela música pop e deixou de inovar. O resultado foi que
o álbum foi completamente ignorado pela crítica e pelo público que praticamente
lhes virou as costas. Como um azar não vem só, o grupo, além de Wolfgang
Flur,viu partir também Karl Bartos em
1991. Apesar de pontualmente substituídos por outros músicos, o grupo iria desaparecer
da cena musical durante quase 20 anos, apesar de, em dezembro de 1999,editarem um tema intitulado “Expo 2000”.
Durante os anos em que se retiraram
voluntariamente de cena, os Kraftwerk , apesar de algumas aparições esporádicas
em festivais, concertos ou eventos especiais, lançaram o álbum “The Mix” (1991)
onde apresentaram os seus(e dos fans) temas
favoritos, misturados e com alguns ritmos dançáveis. Foi uma espécie de cartão
de apresentação a uma nova geração que estava a nascer, uma geração que só só
conheceu o grupo e a sua música nas discotecas e no mercado da música de dança,
o que levou a que a sua música fosse considerada e catalogada como “Música de
Dança e Novas Tendências!” , que falta de gosto e completa ignorância.
Em agosto de 2003, após 17 anos de ausência
dos estúdios, o grupo,reformulado,
edita “Tour de France – Soundtracks” cuja ideia principal era louvar o ciclismo
e para isso, nada melhor do que aproveitar o centésimo aniversário da primeira
Volta á França em Bicicleta que aconteceu em 1903. Apesar de terem perdido o
“timing” do tour, o lançamento do álbum, causou grandes expectativas entre no
mundo da música e estas não foram goradas.
O tema-título era uma nova versãodo tema de 1983, com algumas diferenças a
nível sonoro ede letra, já que a nova
versão incluía referências a momentos-chave da prova e, através das novas
tecnologias, conseguia reproduzir o poderoso som de ciclistas a pedalar.Excluindo a repetição do tema no final do
álbum, O resto do álbum pouco tem a ver com ciclismo. Hutter and Schneider
compuseram algumas peças com temáticas próximas do ciclismo como “Aero Dynamik”,
“Titanium”, “Chrono” ou “Vitamin”, Com as duas últimas peças conceptuais a
tocaram os dois extremos do grupo: “Chrono” amais próxima do som marcante do grupo; enquanto “Vitamin” é aquela que
mais se afasta desse mesmo som.
Mesmo não atingindo a perfeição sonora dosmomentos mais altos da carreira do grupo,
“Tour de France – Soundtracks” foi um sucesso enorme e que os encorajou a fazer
uma extensa tournée mundial,que
originou oprimeiro e único (até ao
momento) álbum ao vivo do grupo que se chamou “Minimum-Maximun” e que seria
editado em junho de 2005. Ao longo de 22 temas (ou 23, no caso da edição alemã),
o público é confrontado com versões perfeitamente executadas, vibrantes, pelas
quatro figuras praticamente imóveis em palco, servidas por uma sucessão de
imagens exibidas em écrans tri-dimensionais, perfeitamente sequenciadas, dando
a sensação de se estar realmente lá!
Pioneiros do chamado electro-pop, o grupo,
ao longo da sua carreira tem sabido brindar o público, novo e antigo, com o que
de melhor se utiliza em termos tecnológicos e, como tal, merecem um lugar á
parte no grande universo da música.
Em Janeiro de 2014, a Academia dos prémios
da música, premiou o grupo com um “Grammy”pela sua carreira.
Nota: as imagens e vídeo que ilustram o texto foram retiradas da Internet
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