quarta-feira, 19 de junho de 2019


                                    Rei Artur - Uma abordagem diferente!



   Os romances históricos que preencheram o imaginário da nossa juventude, também tiveram e têm o seu lugar na sétima arte. Quer sejam os romances de autores como Walter Scott, Alexandre Dumas, Emilio Salgari, Julio Verne ou Thomas Mallory, a todos eles o cinema foi, num tempo ou noutro, buscar inspiração ou até mesmo adaptar para o grande écran. A lenda do Rei Artur é um desses romances.

     

Bretanha, ano 452 a.C., Artur e os seus cavaleiros Sármatas são lendas vivas no que resta do decadente Império Romano do Ocidente. Após 15 anos ao serviço do Império, estão para ser libertados do seu compromisso, mas antes ainda vão ter de cumprir uma última missão: numa altura em que os Saxões invadem a Bretanha, Artur e os seus cavaleiros tem de ir atrás das linhas inimigas buscar uma família Cristã cujo filho está destinado a ser o próximo Papa da Cristandade.

   "Rei Artur" não é mais um filme sobre o Rei Artur, sobre Excalibur, sobre Guinevere nem sobre os seus Cavaleiros da Távola Redonda como a que nos foi dada a ver em “Knights of the Round Table  - Os Cavaleiros da Távola Redonda” (Richard Thorpe, 1953)", ou o musical “Camelot - Camelot” (Joshua Logan, 1967) ou ainda a versão romanceada de “First Knight - O Primeiro Cavaleiro" (Jerry Zucker, 1991). É uma versão, no minímo, diferente daquelas que estamos acostumados a ver. Fortemente inspirada em "Excalibur" (John Boorman, 1981), este sim, baseado no grande romance de cavalaria "Le Morte d’Arthur - A Morte de Artur" escrito por Thomas Mallory no século XV do milénio passado, "Rei Artur" dá uma nova luz às personagens principais ( Artur e Guinevere) e estabelece uma possível origem da lenda, o que, só por si, torna o filme original, diferente. 

   
Para esse facto, contribui a realização de Antoine Fuqua, que já nos dera "Um Dia de Treino" (2001, Óscar para Denzel Washington), "Operação Especial"(2003) ou "Atirador" (2007). A sua realização é dinâmica, movimentada o que torna a sua aproximação ao argumento viva e, em algumas cenas, como a a primeira aparição dos cavaleiros Sármatas ou particularmente na batalha final em Baddon Hill com os Sármatas a parecerem verdadeiros fantasmas contra o exército Saxão, verdadeiramente sobrenaturais, para o que contribui também uma fotografia adequada ás cenas e uma montagem também ela muito rápida, particularmente na cena da batalha do gelo onde se homenageia "Alexander Nevski" (Sergei Eisenstein,1938) e a sua famosa e muito imitada batalha no gelo. É pouco antes de começar a batalha que surge o momento mais desconcertante de todo o filme: a fala de Lancelot para Guinevere, onde ele diz que nas centenas de homens que se posicionam para enfrentar os sete cavaleiros (mais uma guerreira), existem muitos homens sós (numa alusão a uma possível violação ou pior caso percam a batalha), ao que ela responde ”não te preocupes, eu não os deixo violar-te!”.
O momento mais bonito e poético do filme acontece na cena final quando se vêem três cavalos a galopar livremente nos montes enquanto se ouve a voz de Lancelot, como que a testemunhar aquilo que descreve como sendo uma realidade, a dizer que os cavaleiros tombados em batalhas continuam vivos nas lendas que passam de geração em geração.        
   
Como já disse “Rei Artur” é uma reinterpretação da lenda original, mas que não deixa de ser interessante na mesma: Artur não é um cavaleiro medieval, mas sim um oficial romano; Merlin, o mágico que na lenda original cria e protege Artur, aqui aparece como uma espécie de vilão que manda na Bretanha e observa o trabalho de Arur e dos seus cavaleiros; não existe o triângulo amoroso entre Artur, Guinevere e Lancelot. Artur e Guinevere envolvem-se romanticamente e apenas algumas (poucas) cenas mostram alguma tensãoe possível romance entre a guerreira celta (outra alteração á lenda original) e o cavaleiro Sármata; Tristão não tem direito á sua Isolda; Galahad, Gawain e Dragonet aparecem já como cavaleiros e companheiros de Artur e Bors é um cavaleiro barulhento, bravo e um extremoso pai de (nem ele sabe) inúmeros filhos, ao contrário do material da lenda, onde o seu estado celibatário, lhe permite testemunhar a importância do Cálice Sagrado; a própria Távola Redonda mal aparece no filme e existem muitas mais diferenças entre a lenda clássica e o que surge no filme.
   Além das personagens, a única ligação á lenda é a inclusão dos saxões como os adversários de Artur e a batalha de Badon Hill. Outra diferença, talvez a mais saliente de todas é que o pai de Artur, no filme é um general romano e a sua mãe é uma mulher celta. A lenda diz que o pai de Artur é Uther Pendragon, um dos primeiros reis da Bretanha e que a sua mãe é Igraine, uma mulher lindíssima que já fora casada com Gorlois, o duque da Cornualha e um dos súbditos mais leais de Uther. A ascendência de Artur é mostrada num “flashback” nocturno, onde também se vê como é que a espada chamada Excalibur (outro elemento pouco referido no filme) vai parar ás mãos de Artur.       
   
Apesar de alguma aproximação supostamente histórica, David Franzoni, que em 2000 escreveu o argumento de “Gladiador”, realizado por Ridley Scott, optou, em “Rei Artur” por alguma liberdade criativa em termos de pessoas, acontecimentos, religião, guarda-roupa e armamento. Assim posicionou a acção do filme, ao contrário de outras produções que a situam na Idade Média, a ter lugar no início dessa mesma Idade Média para dar alguma credibilidade a “Artorius Castus” (nome completo de Artur) e ás suas origens romano-celtas. Franzoni aprofundou ainda mais as diferenças entre a lenda e o seu argumento ao envolver Roma e o seu desejo de defender o seu território na Bretanha contra a invasão eminente dos Saxões, e a sua decisão de apoiar os “Woads”, liderados por Merlin, contra os bárbaros. Mas, percebe-se pelo comportamento de determinadas personagens, nomeadamente o Bispo Germanus, que Roma está em declínio e começa a falhar nos seus propósitos de manter os territórios nas partes mais longínquas do império. Isso deixa Artur sem sem grande apoio dos romanos e a ter que decidir se enfrenta os Saxões sózinho ou se conta com o apoio de Merlin e dos seus “Woads”
             
Com um  elenco onde pontuam os nomes de Clive Owen e Keira Knightley, ambos ainda no principio das suas carreiras, embora Owen, apesar da sua prestação ser dura e poderosa, pareça não estar á vontade no papel principal, Knightley, ao contrário, surge-nos com ar frágil quando entra em cena e depois torna-se simultaneamente sexy e uma mulher de acção que facilmente faz sombra a qualquer homem de acção. A dupla principal é bem secundada por Ioan Gruffud como Lancelot e melhor amigo de Artur, Ray Winstone que compõe um Bors cheio de basófia, mas um excelente guerreiro e seguidor fiel de Artur, Stephen Dillane é Merlin, o chefe dos Woads e ainda Stellan Skarsgard, como Cerdic, o chefe do exército Saxão cujo único fito é conquistar a Bretanha e derrotar Artur. O elenco inclui ainda os nomes de Mads Mikkelsen, Hugh Dancy e Til Schweiger.     
       Quando estreou, “Rei Artur” foi um inesperado sucesso, tanto da crítica como do público. 
   Inicialmente o filme era para estrear com uma classificação de “R”, que corresponde a um filme violento, mas depois de montado, o filme foi exibido para os executivos da Disney que exigiram que o filme fosse classificado como “PG-13, que corresponde a uma classificação para 13 anos (uma espécie de “não aconselhável a menores de 13 anos” ou “interdito a menores de 13 anos”, segundo a nossa antiga classificação dos filmes) e para obedecer a essa exigência, o filme teve de ser remontado. O sucesso, no entanto, encorajou Antoine Fuqua, a lançar, algum tempo depois da estreia, a “Director’s Cut”, passando a duração dos 126 minutos iniciais para os 142 minutos, com cenas adicionais das batalhas tornando-as mais sangrentas e com violência mais gráfica e mais cenas entre Lancelot e Guinevere aproximando o filme um pouco mais da lenda. Outras cenas incluem conversas entre os cavaleiros num acampamento á volta duma fogueira e uma remontagem da cena em que Artur e Guinevere fazem amor . Nenhuma destas inclusões altera a narrativa, apenas a completa, apesar de nada acrescentar ao que já lá estava.
   
“Rei Artur”, embora seja mais do mesmo, mais uma versão de uma lenda que já foi adaptada ao cinema vezes sem conta, tem a particularidade de, pelo menos, ser diferente na abordagem de tão famosa lenda o que o torna num bom entretenimento sem aspirar a ser algo mais do que isso.






Nota: as imagens e vídeo que ilustram este texto foram retirados da Internet





 





                                             

EMERSON, LAKE & PALMER II

            O trio, depois de um longo período de férias, sentindo-se revigorado, reuniu-se novamente em 1976, nos “Mountain Studios”, em Mo...