quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

O Bom, O Mau e o Vilão – O Melhor do Western Spaghetti



    O western, assim como o musical, foram os géneros mais queridos do cinema. O western, inclusive, chegou a ser "importado" para a europa, pela mão de Sergio Leone criando assim as raízes de um sub-género intitulado "western spaghetti" que viria a obter um considerável sucesso tanto na europa como nas terras do tio Sam.
   
"O Bom, o Mau e o Vilão" é a história de três homens que procuram um tesouro que está enterrado algures num cemitério. Cada um deles sabe uma parte da localização do tesouro, pelo que vão estar dependentes uns dos outros para lá chegar. Sem olhar a meios para obter os fins, os três vão tentar chegar ao local, onde os aguarda aquela recompensa, através dum país devastado pela guerra civil.     
A ideia do filme começou a tomar forma, quando os executivos da United Artists se aproximaram de Luciano Vincenzoni, argumentista do filme “Por Mais Alguns Dólares”, que acabara de obter um sucesso inesperado em itália e convidaram-no a escrever outro argumento para um projecto de um novo “Western Spaghetti”.Sem planos imediatos de trabalho, Vincenzoni concordou desde que Alberto Grimaldi e Sergio Leone, respectivamente, produtor e realizador do filme anterior fizessem parte deste novo projecto. Quando os executivos da distribuidora concordaram, Vincenzoni avançou com a ideia de três canalhas que procuravam um tesouro durante a Guerra Civil Americana. Leone agarrou a ideia e, numa tentativa de mostrar o absurdo da guerra, desenvolveu-a e transformou-a num argumento, com a ajuda de Sergio Donati, com quem o realizador já trabalhara em “Por Mais Alguns Dólares”.
   
Realizado por Sergio Leone, "O Bom o Mau e o Vilão" é, considerado pelo realizador, o último filme da chamada "trilogia dos dólares", sendo os dois primeiros "For a Few Dollars - Por um Punhado de Dólares" (1964) e "For a Few Dollars More - Por Mais Alguns Dólares" (1965). Como a acção de “O Bom O Mau e o Vilão” se passa durante a Guerra Civil Americana (ou de Secessão), o filme pode, não só ser o final da trilogia como pode servir também de prequela aos outros dois filmes, cuja acção decorre depois da Guerra de Secessão.
Desde sempre, Leone teve como sua marca  os grandes planos de rostos e das armas antes e durante  um duelo, que lhe permitem encenar e misturar cenas de rostos extremos, grandes planos épicos, com os diálogos reduzidos ao minímo, onde as mãos, quase em câmara lenta, se dirigem para as armas nos coldres e também grandes sequências sem um único diálogo. Tudo isto cria um ambiente de tensão e suspense que permite ao espectador saborear os desempenhos de cada personagem e perceber as suas reacções, mas também dá ao realizador a possibilidade de filmar belas paisagens. Não é, portanto, de estranhar que o inicio deste filme seja precisamente um grande plano de rostos de cowboys, das suas armas e de uma cidade em ruínas e sem um único diálogo, antes do duelo onde nos será apresentado o primeiro protagonista do trio central da história: a imagem, depois do duelo, congela e surge o título da personagem no écran; é um achado fabuloso de Leone e que funcionará da mesma maneira para as outras duas personagens do filme. Só então é que o filme começa verdadeiramente.
 Por ser considerado o pai do sub-género western-spaghetti, Leone enche o écran de constantes referências aos filmes americanos de John Ford a Howard Hawks e toda a simbologia do velho oeste está presente na obra do realizador desde "dólares" até "Aconteceu no Oeste" (1968).
   
Sergio Leone não trouxe dos Estados Unidos só o saber como fazer, trouxe também mão-de-obra para edificar o sub-género no velho continente. Com ele vieram Eli Wallach, no papel de Tuco (o Vilão), um eterno secundário que já brilhara em outro western chamado "Os Sete Magnifícos" (John Sturges, 1960) remake americano dessa obra-prima do cinema chamada "Os Sete Samurais" (Akira Kurosawa, 1954). Apesar de ser uma prestação ao seu nível, o actor quase que rouba o protagonismo a Eastwood e a Van Cleef, tal é a forma como agarra a sua personagem, da qual, ao longo do filme, ficamos a conhecer toda a sua história, já que conhecemos o seu irmão, um padre de nome Pablo Ramirez, de onde veio e porque se tornou bandido;
   
Lee Van Cleef, é “Angel Eyes” (o Mau), mercenário sem escrúpulos, obsessivamente insano, termina sempre o trabalho para que foi contratado (que habitualmente é encontrar pessoas e matá-las), o actor sempre associado a papéis de vilão e que teve, com Leone, o momento mais alto da sua longa carreira;
Clint Eastwood (o Bom), é o “Homenm sem Nome” (apesar de Tuco lhe chamar “Lourinho”), um ténue mas convencido caçador de prémios que se vê obrigado a formar alianças pouco convencionais nas necessárias para encontrar o tesouro com Tuco e temporariamente com “Angel Eyes”. Eastwood, na altura um obscuro actor que, ao ir para itália filmar com Leone a "trilogia dos dólares", passou do relativo anonimato a estrela de cinema e posteriormente num realizador afamado que viria a tornar-se uma referência obrigatória no panorama do cinema mundial. Juntos, Leone e Eastwood, tornaram a personagem de “O Homem sem Nome”, não apenas numa personagem qualquer, mas numa personagem Maior do cinema – uma personagem que nunca teve que se explicar, uma personagem, cuja presença era mais que suficiente para encher o écran. 
     
Apesar da relação tempestuosa entre ambos, Eastwood, que nunca mais voltaria a ser dirigido por Leone (mesmo quando este lhe ofereceu o papel de “Harmónica” em “ Aconteceu no Oeste”, que o actor declinou e que seria dado a Charles Bronson ), o actor aprendeu muito, com a obsessão de Leone em filmar cenas de diferentes ângulos prestando atenção aos mais ínfimos pormenores, o que muitas vezes esgotava os actores, durante as rodagens dos filmes da trilogia e, anos mais tarde, acabaria por lhe dedicar “Unforgiven – Imperdoável” (1992), uma das suas obras-primas.
Majestoso, visualmente estilizado, "O Bom, o Mau e o Vilão", avança num crescendo de acção e tiros desde a já referida sequência inicial até ao final onde o filme atinge o seu climax: o duelo a três no cemitério onde Sergio Leone, chamando a si todo o seu conhecimento, homenageia o Western, com a excepcional banda sonora de Ennio Morricone, colaborador frequente em todos os filmes de Leone, como pano de fundo, num misto de mito e realismo.
   
Leone, durante a rodagem, gostava de tocar a banda sonora para manter os actores dentro do espírito da cena e isso percebe-se perfeitamente em duas cenas importantes no enredo: a primeira acontece no campo de prisioneiros Nortista de Batterville onde os prisioneiros cantam e tocam o tema melancólico “La Storia Di Un Soldato” (The Story of a Soldier) enquanto Tuco é torturado e espancado por Angel Eyes; a segunda é quando os três protagonistas se enfrentam em Sad Hill, com “L’estasi dell’Oro” (The Ecstasy of Gold), seguida por “Il Triello” (The Trio) em fundo. A composição desta cena é absolutamente magnífica: uma fortuna em ouro está enterrada numa das campas, três homens, cada um na expectativa de lhe deitar a mão, enfrentam-se sabendo que, se um dispara, todos disparam e todos morrem. A não ser que dois decidem abater o terceiro homem antes que ele dispare sobre eles. Mas a dúvida está instalada: quais dois? E qual terceiro? E permanece durante os vários minutos que Leone dedica aquele momento único no filme: começa com um admirável longo plano que depois se converte em “close-ups” de armas de fogo, rostos, olhos e suor num interminável exercício de estilo e “suspense” com que o realizador brinda os espectadores.
    “O Bom, o Mau e o Vilão” estreou em Itália a 15 de dezembro de 1967 e rendeu cerca de 6.300.000 dólares , o que na altura foi considerado bastante. Nos estados unidos, a trilogia dos dólares estreou em 1967, mas em diferente datas para poder rentabilizar os filmes obtendo o maior sucesso possível.
A versão original italiana tem a duração de 177 minutos, mas inicialmente,  a versão internacional foi exibida com diversas metragens que vão desde cerca de 148 minutos até 161 minutos. Sendo que esta última é a mais conhecida e a que foi mais exibida desde a estreia do filme. Em 2002, o filme foi restaurado e as cenas cortadas foram todas re-inseridas no filme com os actores, Clint Eastwood e Eli Wallach a repetirem as suas falas no material recuperado e Simon Prescott, um actor de dobragens, a fazer a voz de Lee Van Cleef , o actor faleceu em 1989.
     
Filme ambicioso, com  quase três horas de duração, onde nada parece faltar e ainda haveria espaço para mais história, senão vejamos: temos o tiroteio inicial que envolve personagens que pouco ou nada têm a ver com trama inicial. Temos o jogo do condenado, no qual, Wallach faz de homem procurado e Eastwood aparece para o entregar e depois, quando ele está para ser enforcado, o mesmo Eastwood salva-o “in extremis” com um tiro bem disparado e ambos recebem a recompensa. Depois vem a magnifica sequência do deserto em que Eastwood abandona Wallach no deserto e, mais tarde, será Wallach a fazer o mesmo a Eastwood e, quando o sol queima e receamos o fim de “Loirinho”, surge a diligência numa corrida desenfreada, carregada de mortos e moribundos e a história ganha um novo fôlego que culminará no inevitável, porém, magnifico e majestoso duelo. Pelo meio, acontece a ambiciosa sequência da Guerra Civil Americana onde, além da cena da tortura, acontece outro momento tocante do filme: Clinton, um capitão do exército da União (nortista), que se torna amigo de Tuco e Blondie e que alimenta o sonho de ver a ponte de Branston, local estratégico que separa os dois exércitos, destruída, explica o seu alcoolismo de uma maneira absolutamente simplista “O comandante que tiver mais bebida para embebedar as suas tropas antes da batalha, é aquele que vence”. Mortalmente ferido no combate que se segue, sua última fala, pouco antes de morrer, é “Podem ajudar-me a viver um pouco mais? Eu espero boas notícias”.

  “O Bom, o Mau e o Vilão” foi, indiscutivelmente, a obra mais inovadora que o sub-género western-spaghetti viria a conhecer. Muitas vezes referida, imitada, mas nunca igualada, tendo sido até  homenageada em "No Country for Old Men - Este País não é para Velhos" (Joel e Ethan Coen, 2007), que venceu 4 Óscares da Academia, incluindo o de Melhor Filme do Ano e Melhor Realização, o original de Sergio Leone permanece como um filme intemporal, obra-prima do género em que se insere

Nota: imagens e vídeo retirados da Internet








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