O Tempo passa sem parar, como um rio que corre em direcção ao mar, dissipa-se nas brumas da Memória colectiva... É o Tempo que serve a memória ou é a memória que serve o Tempo?
sábado, 11 de outubro de 2014
Os Condenados de Shawshank
Em 1963 “The
Great Escape – A Grande Evasão”, realizado por John Sturges, baseado num livro
escrito por Paul Brickhill,inspirado em
acontecimentos verídicos ocorridos durante a IIªGuerra Mundial onde prisioneiros
de guerra aliados planeiam fuga de um
grande número dos seus pares dum campo de concentração nazi. O filme
apresentava uma constelação de vedetas que incluíam Steve McQueen, Richard
Attenborough, James Garner, Charles Bronson, James Coburn, Donald Pleasence,
entre outros e mostravatodo o
planeamento e logística que envolviam a fuga. Tornou-se um clássico
rapidamente, várias vezes imitado mas nunca superado e deu origem, ao longo das
décadas seguintes, a uma série de filmes cuja temática girava em torno de
prisões ou de fugas das mesmas, com maior ou menor qualidade.
O Argumentista e Realizador Frank Darabond
Realizado em
1994 por Frank Darabont, "Os Condenados de Shawshank" foi logo
considerado um clássico contemporâneo pela sua abordagem original, fugindo ao
convencional filme de prisão. A História, da amizade e esperança entre dois
condenados numa prisão estadual, cativou a crítica e o público. Baseado num
conto de Stephen King, é um dos filmes mais inteligentes dos últimos anos.
Frank
Darabond, argumentista de cinema e televisão, garantiu os direitos de adaptação
desta história em 1983 depois de ter impressionado o escritor Stephen King com
a adaptação de “The Woman in the Room”, um pequeno conto do escritor que
transformou numa curta-metragem. Os dois tornaram-se amigos e Darabond, depois
de ter obtido sucesso com o argumento partilhado em “A Nightmare on Elm Street III: The Dream
Warriors – O Pesadelo em Elm Street III” (Chuck Russell, 1987), comprou os
direitos de adaptação do conto “Rita Hayworth and Shawshank Redemption” e optou
por ser ele mesmo o realizador do filme. King, apesar dos problemas que costuma
ter com aadaptação das suas obras para
o cinema, deu um voto de confiança ao aspirante a realizador.
Rob Reiner,
que já tinha adaptado anteriormente o conto do escritor “The Body” e
transformara no fabuloso “Stand By Me – Conta Comigo” (1986), tentou comprar os
direitos a Darabond, que escreveria o argumento. O então realizadorplaneava ter como protagonistas Tom Cruise no
papel de Andy e Harrison Ford no papel de Red. Darabond considerou a proposta,
entusiasmado com a visão de Reiner, mas declinou a oferta pois achou que era a
altura certa para “fazer algo mesmo grande” ao estrear-se na realização.
“Os
Condenados de Shawshank” cria uma espécie de calma nos sentimentos dos
espectadores. Parece algo estranho para se dizer acerca dum filme que se passa
dentro duma prisão. Enquanto na maior parte das produções do género, o
espectador é confrontado logo com sentimentos e experiências indirectas e
emoções violentas e superficiais, em “Os Condenados de Shawshank”, tudo isso abranda,
fazendo com que o espectador faça parte daquela família. Utiliza a voz calma,
porém observadora, do narrador para nos incluir na história de homens que
formam uma comunidade atrás das grades: a esperança, a amizade e a sua continuidade
pela vida fora, é mais profunda do que na maioria dos filmes e, neste caso, a
sua maior diferença.
O que é
interessante no filme e que também marca a diferença em relação a outros do
género, é o facto de, apesar da personagem principal ser o condenado e
ex-banqueiro, Andrew Dufresne, a acção nunca se vê do seu ponto de vista, mas
sim do ponto dos companheiros de prisão. Tal ideia está perfeitamente espelhada
na cena inicial quando Andy é condenado a duas sentenças perpétuas pelo
assassinato da mulher e do amante dela, depois a cena muda (permanentemente)
para o ponto de vista da população prisional, muito particularmente, de Ellis
“Red” Redding (Morgan Freeman, extraordinário), é a sua voz que nos apresenta
Andy (Tim Robbins numa das suas melhores interpretações) a lembrar-se de quando
ele chegou a Shawshank e que prevê, erradamente, que Andy nunca sobreviveria na
prisão.
Desde a
chegada de Andy á prisão (naquele magnifico plano-sequência vertical) até ao
final do filme, vemo-lo apenas como os outros o vêem: Red, que se torna o seu
melhor amigo, Brooks, o velho bibliotecário, Norton, o director da prisão, os
guardas e até mesmo os outros prisioneiros. Red acaba por ser aquele com quem
nos identificamos e a redenção, de que fala o título original do filme, acaba
por ser a dele; Red é o nosso infiltrado e Andy é o exemplo de que se deve
manter a integridade total, ocupar e dividir o tempo, nunca perder a esperança
e aguardar a nossa chance , todas estas ideias estão resumidas numa frase que,
a dado momento, Andy diz a Red, “tudo se resume a uma simples escolha: ou te
ocupas para te manter vivo ou arranjas maneira de morrer”.
Outro
aspecto que faz com que “os Condenados de Shawshank” seja diferente do resto
dos filmes do género é a construção da estrutura
narrativa do argumento que nos empurra para a personagem de Andy e para o seu estranho
comportamento dentro da prisão. Sem querer, interrogamo-nos: Quem é aquela
personagem tão calada que se passeia no pátio da prisão como se fosse um homem
livre enquanto os outros conspiram e se lamentam acerca da sua sorte? será que
ele matou a mulher e o amante?Se
Darabond tivesse decidido que a personagem de Andy seria o centro heroico do
filme, este teria sido certamente muito mais convencional e banal e muito menos
misterioso.
Tim Robbins e Morgan Freeman
Antes de Tim
Robbins e Morgan Freeman serem escolhidos para interpretar os papéis de Andy Dufresne e Ellis Boyd “Red” Redding, foram considerados para os respectivos
papéis: Kevin Costner, Tom Hanks e Brad Pitt, que recusaram devido a conflitos
de horários com outras produções em que se achavam envolvidos (respectivamente
“Waterworld”, “Forrest Gump” e “Entrevista com o Vampiro”); para o papel de
Red, apontaram-se os nomes de Clint Eastwood, Harrison Ford, Paul Newman e
Robert Redford. A escolha acabou por recair em Morgan Freeman, porque Frank
Darabond achou que a sua presença e comportamento eram suficientemente
autoritários para ser ele o escolhido. Segundo Darabond, decisivo terá sido o
curto diálogo, durante a leitura do argumento, entre Andy e Red quando aquele
pergunta a este qual a origem da sua alcunha (“Red”) e Red responde “talvez por
eu ser irlandês!”.
Bob Gunton como o Director Norton
Todo o elenco é magnifico nos seus papéis, masas escolhas de Clancy Brown como o Capitão
Byron Hadley, chefe dos guardas que acha que o melhor para manter os
prisioneiros nos seus lugares é moê-los com pancada e de Bob Gunton, como o
director Samuel Norton, versado na Bíblia, apresentando-se como um homem pio, cristão
devoto e aberto a inovações, revela-se na realidade como sendo corrupto,impiedoso e sem escrúpulos, foram magníficas
no que toca ao elenco secundário porque o espectador, mesmo tendo alguma
compaixão por elas sensivelmente a meio do filme,nunca deixa de as odiar completamente.
Todo o filme
é suportado pela personagem de Red, ele é uma espécie de curvatura espiritual.
Vemo-lo em três audições para obter a liberdade condicional: a primeira, e a
mais bem conseguida de todas, graças a um truque de argumento, acontece logo
após sabermos a sentença de Andy e quando vemos a auditoria, pensamos que já se
passaram vários anos e que Andy vai tentar obter a liberdade condicional. Mas,
não, afinal é quando vemos Red pela primeira vez a tentar convencer os
auditores que está reabilitado; a segunda, ela já conhece os procedimentos e
sabe o que o espera; na terceira, ele rejeita toda e qualquer possibilidade de
ser reabilitado, já está muito para além dela e di-lo aos seus auditores,
sentindo-se livre de qualquer constrangimento. Os auditores concedem-lhe a
liberdade. Sobresiste um problema: na prisão: na prisão, Red é o rei, éaquele que consegue arranjar tudo sem nunca
se comprometer. Cá fora, ele não tem identidade ou qualquer “status” e, tendo
visto, o que aconteceu a Brooks, só e abandonado em liberdade, o espectador é
levado a recear pela sua vida. Mas, no último terço do filme, Andy ajuda Red a
aceitar a sua liberdade, através de cartas e postais, e é visto através da
mente de Red.
Quando
estreou, “Shawshank Redemption”, obteve boas críticas entre a imprensa
especializada, mas feztão pouca
bilheteira, que não conseguiu pagar-se: de 25.000.000 de dólares de orçamento,
o filme apenas conseguiu 18.000.000 de dólares de receitas. Desde o facto de
ter um título horrível, a ser demasiado longo e quase sem acção, mesmo tendo
actores respeitados mas que não eram grandes vedetas, tudo foi usado para
justificar o fracasso nas bilheteiras. Claramente se percebeu que este filme
era daqueles que precisava de andar de boca em boca para encontrar o seu
público. Rapidamente foi retirado das salas e só quando obteve as sete
nomeações para os Oscares da Academia, incluindo uma para Melhor Filme do Ano,
voltou ás salas e o público voltou as suas atenções para o filme, rendendo-lhe
mais cerca de 10.000.000 de dólares.
Apesar de
não ter ganho nenhum Oscar, o filme, ganhou outros prémios, desde então, ganhou
uma nova vida e passou a fazer parte do “Top Five” das listas de críticos,
imprensa especializada e é o filmemais
bem classificado (para quem segue estas classificações, 9.3/10) no IMDB, a base
de dados cinematográfica da internet,ultrapassado “O Padrinho”(1972), que foi, durante muitos anos o filme
que tinha a mais alta classificação (9.2/10).
Frank
Darabond construiu o filme para observar a história e não para a elevar ou
encenar. A encenação não existe na obra, o filme avança ordeiramente e reflecte
a passagem lenta das décadas. “Quando te colocam naquela cela”, diz Red a dado
momento “Quando as barras se fecham, é quando sabes que é verdade” . Alguém
disse que a vida é uma prisão, nós somos o Red, Andy é o nosso redentor.
Em 2004, no
seu 10º aniversário “The Shawshank Redemption” foi incluído na lista do AFI
(American Film Institute) como o 23º melhor filme de todos os tempos.
Nota: as imagens e vídeo que ilustram o texto foram retirados da Internet
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