segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Barry Lyndon - Os Quadros de Stanley Kubrick

   
                                                                                                         


      Kubrick sempre quis fazer um filme histórico. Uma biografia de napoleão foi um projecto que ele acarinhou durante muitos anos mas que nunca lhe foi possível realizar porque nunca obteve financiamentos para isso. Herdou "Spartacus" (1960) de Anthony Man, depois deste ter sido despedido pelo produtor do filme. Mas a sua associação a "Personas non gratas" em Hollywood como Kirk Douglas, ou Howard Fast, autor do livro em que se baseia o filme, restringiram-lhe a sua liberdade criativa e levaram-no a ter problemas na distribuição da obra em terras americanas. Em 1975 "Barry Lyndon" acabou por ser a sua única obra histórica.
    Redmond Barry é um jovem Irlandês sem eira nem beira, vive com a mãe viúva e apaixona-se por uma prima que, no entanto, está prometida a um capitão do exército Inglês. Não suportando ser trocado por um oficial britânico, Redmond desafia-o para um duelo e mata-o sendo obrigado a fugir do país começando assim a sua odisseia por uma europa turbulenta em busca da sua própria identidade.
     Baseado num romance de William Makepeace Thackeray,"The Memoirs of Barry Lyndon, Esquire", escrito em 1844, onde se conta a história, as tribulações, provações e a má sorte de um irlandês, contada a partir do seu ponto de vista. "Barry Lyndon", divide-se em duas partes e um epílogo, como se de um livro se tratasse,  passa-se no século XVIII, um período conturbado na história da europa assolada por guerras, palco onde Redmond se vai tentar afirmar. De soldado britânico a jogador de cartas profissional e por fim Lord, mercê de sua inteligência e de um ou outro golpe, umas vezes de sorte outras de azar, a ascensão de Barry é quase meteórica, ao contrário do filme que avança lentamente, sem nunca ser monótono, graças ao perfeccionismo visual e  técnico a que a obra foi sujeita.
 Produção sumptuosa e uma reconstituição histórica rigorosa, aliados a uma fotografia nada menos que fabulosa fazem de "Barry Lyndon" uma obra que não envelhece com o tempo...Kubrick tinha esse dom: fazer filmes que nunca passam de moda!
    A sua realização é, como sempre, genial e inventiva (as marcas fortes de Stanley Kubrick), sem mácula. Utilizando, como já o fizera em "Laranja Mecânica"(1971), uma narrativa em voz off, Kubrick consegue, em tons irónicos por vezes, dramáticos noutras, ilustrar o filme com imagens e cenas que deliciam qualquer cinéfilo que se preze de o ser. Cada imagem é como se fosse uma tela onde o artista (neste caso Stanley Kubrick) pinta (filma) criando cenas de uma beleza tal que faziam inveja a qualquer pintor ou fotógrafo.
Em "Barry Lyndon" Kubrick tira partido de toda a luz natural não usando para o efeito nenhum holofote para iluminar os cenários, nem mesmo nas cenas nocturnas ou de interiores onde usou a luz de velas para filmar o que dá um efeito real, mas ao mesmo tempo sobrenatural e grotesco, das personagens em cena, mercê duma lente especial feita pela NASA e adaptada pelo realizador para utilizar nas câmaras de filmar. Mais um ponto a favor do realizador que ao utilizar esta técnica inovadora, elevou a história da fotografia a outros patamares.
    Para interpretar Redmond Barry, Kubrick chamou Ryan O'Neal, conhecido pelo seu papel em "Love Story" (Arthur Hiller, 1970), um dos filmes-referência da década de 70 do século passado. História de amor entre um rapaz de classe social alta e uma rapariga de baixa condição social e os problemas que se lhes deparam. Ryan O'Neall junta à sua carreira um papel que lhe deu alguma projecção mas que nunca passou disso.
Para o papel de Lady Lyndon, o realizador foi buscar uma ex-top model da revista "Vogue" para a qual Kubrick trabalhara no inicio da sua carreira como fotógrafo e onde conhecera a modelo. Usando a sua beleza algo melancólica, Kubrick consegue alguns dos mais belos planos jamais fotografados: A cena em que Lady Lyndon, completamente abstraída da realidade toma banho semi-nua, ladeada pelas suas duas criadas é duma beleza plástica dificil de igualar.
Utilizando uma banda sonora maioritáriamente de compositores como Haendel, Schubert,Vivaldi, Bach ou Mozart, Kubrick consegue a melhor banda sonora para o seu filme e conferir-lhe o realismo necessário para o tornar credível ao olhar mais incrédulo que possa surgir.
    O trabalho de Kubrick neste filme é, como habitualmente, irrepreensível. Já não há adjectivos que o possam qualificar, apenas podemos repetir o que já foi dito por tanta gente que comentou e comenta a sua obra: um génio absoluto e que muita falta faz ao cinema de hoje.
     De "Barry Lyndon" retemos algumas cenas que são absolutamente inesquecíveis: O prólogo onde a voz off introduz a obra, onde vemos um duelo de pistola e a realização nos enquadra na cena; As cenas de batalha em que Redmond se destingue e onde são apresentadas ambas as perpspectivas
do campo de batalha; A cena do funeral de Byran onde o trabalho de realização e a banda sonora se fundem num momento sublime de cinema: um grande plano dum caixão vai abrindo gradualmente e o tema "Sarabande " de Haendel faz as honras daquela que será talvez a imagem mais marcante de todo o filme: o cortejo fúnebre; O confronto entre Lord Bullington e Barry Lyndon em que o brilhantismo de realização o torna no duelo  mais longo da história do cinema. São cenas assim que tornam este filme num momento único.
    Pode-se também dizer que este filme não surgiu por acaso na filmografia do realizador. Ao aparecer a seguir a "Laranja Mecânica", Kubrick, que nesse filme delapida um futuro pouco radioso à sociedade, quis com "Barry Lyndon", além de fazer o seu filme histórico, dizer que a estupidez humana pode levar àquela situação; por outras palavras, quis dizer que, se a humanidade não aprender com o seu passado (aqui o séc.XVIII, que foi, em termos de guerras, tão mau, como o foi o séc.XX), poderemos muito bem estar perto do tempo da acção de "Laranja Mecãnica". Kubrick era isto mesmo: um visionário capaz de olhar para o passado e criticá-lo assim em "Barry Lyndon", mas também olhar para o futuro e torná-lo tão credível como o presente. Tal capacidade é previlégio só de alguns!
    Nomeado para sete Óscares da Academia, "Barry Lyndon" venceu quatro, todos de categoria técnica incluindo o de Melhor Fotografia que seria um verdadeiro atentado se tal prémio não viesse parar a este filme.
    Filme tantas vezes referenciado na obra do realizador, mas algo ignorado no seio da sua filmografia. Será que se pensou que este filme, tal como "Eyes Wide Shut" (Stanley Kubrick, 1999), nunca seria feito tal era o desagrado do realizador nesta época? nunca o saberemos. O que sabemos é que "Barry Lyndon" é, e será sempre, um filme de Stanley Kubrick, incontestávelmente um dos melhores realizadores de todos os tempos, cuja obra continuará a ser um manancial da sétima arte.
A não perder.

Nota: Todas as imagens e vídeos que ilustram o texto foram retirados da Internet

1 comentário:

  1. Barry Lyndon tornou-se aliás no filme mais insólito que Kubrick realizou depois de obras primas como 2001 e A Laranja Mecânica. Isso só revela o seu génio, uma vez que conseguiu realizar logo a seguir um obra que pouco ou nada tenm a ver com as nteriores, mas dentro dop seu estilo muito próprio. Embora seja algo mal amado por alguns, é, na minha opinião, também ele um dos filmes que melhor definem o seu cinema. Um abraço.

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